Coluna Literatura com Mazé Nóbrega

Presentear com livros: dicas dos pequenos leitores

Desde 2017, as editoras Moderna e Salamandra desenvolvem o projeto “Leitura em Família” no qual se sustenta que ler junto é a base da formação de leitores. A cada lançamento, uma mãe ou um pai é convidado a ler com seus filhos o livro em questão e produzir um pequeno depoimento a respeito dessa experiência. Esses delicados relatos ficam disponíveis aos interessados acessando o QR Code que consta dos volumes. Como coordenadora desse projeto, devo confessar que adoro poder imaginar esses pequenos acontecimentos e saborear os comentários desses leitores tão especiais.

Com a proximidade do final do ano, pensei em organizar uma lista com dicas literárias para quem quer presentear com livros. Adoro fazer isso! Alguém conhece uma criança que não goste de histórias? Curiosas, gostam de saber o que acontece com as personagens, o que elas sentem; interativas, adoram conversar com as pessoas com quem compartilham esses textos.

Ah, sim… por que comecei este post falando do “Leitura em Família”? Porque tive a ideia de realizar uma enquete com os pequenos colaboradores do projeto: entre os livros que você leu, qual escolheria para dar de presente?

Aí vão as sugestões dos nossos “grandes” leitores…

Oscar, o protagonista de O cachorro do menino, consegue convencer sua mãe a comprar um cachorro igual ao do seu melhor amigo, mas o filhote tem um sério problema: é incapaz de andar. O que fazer com esse animal? Nesse livro, César Obeid conta a história de dois jeitos: em prosa e em verso. A versão em prosa é mais realista, concisa e direcionada ao desenrolar das ações. A versão em cordel, com a sonoridade das rimas, é mais emotiva e faz com que os dilemas e angústias das personagens ganhem volume.

O Arthur gostou muito do livro, principalmente da parte em que Oscar adapta um carrinho de brinquedo para permitir que o cachorrinho ande. Que bonito ver como ele se deixa tocar por algo tão pungente, não é? Quem seria o presenteado? O próprio pai… Por que será? Alguém tem um palpite?

Esse livro reúne algumas histórias de um dos personagens mais interessantes da cultura oral brasileira: Pedro Malasartes. Sua esperteza e seu cinismo fazem com que passe a perna em ingênuos incautos, fazendeiros poderosos, nobres e até mesmo santos e demônios. O que há de mais interessante nessa edição é ter aproximado a narrativa tradicional da linguagem contemporânea dos quadrinhos. O carisma da figura de Malasartes e o tom humorístico das histórias se ajustam muito à linguagem dinâmica e imagética dos quadrinhos, que pode ser extremamente rica na formação do leitor na medida em que exige a elaboração de uma síntese a partir de informações oferecidas em ao menos dois níveis diferentes: o plano da palavra escrita e o plano das imagens.

Miguel indica o livro citando o título, a autora e o ilustrador. Referência completa. Justifica sua escolha pela personagem: Pedro Malasartes engana, trapaceia e é muito engraçado. Dentre as histórias, destaca a “Sopa de Pedra” que deve ter ficado mesmo uma delícia depois que o Malasartes, com a sua conhecida lábia, conseguiu os ingredientes de uma velha avarenta e muito egoísta.

Em O estranho dia de Luísa, Ilan Brenman faz o leitor lembrar de que nem mesmo na infância todos os dias são alegres e despreocupados: há dias em que tudo nos parece desagradável. Luísa nunca diz exatamente o que lhe incomoda, mas faz questão de deixar claro que amanheceu em descompasso com o mundo. O autor parece nos lembrar que um dia não é simplesmente um intervalo de tempo. Nesse ínterim, podemos brigar com o mundo e depois fazer as pazes.

Helena achou graça da personagem falar “não” para tudo e gostou muito das ilustrações. Achar graça de Luísa é um jeito de achar graça daqueles dias em que nós mesmos cruzamos os braços e fazemos cara feia para tudo e para todos, afinal, até as princesas têm seus dias de ogro, não é?

Em Laís, a fofinha, Walcyr Carrasco convida o leitor a conhecer uma garota que não se encaixa nos modelos de beleza que a sociedade cruelmente parece exigir: ela está um pouco acima do peso. Em uma época em que a imagem parece ser mais valorizada do que a realidade, abordar as consequências que a pressão pelo padrão ideal pode gerar no cotidiano de uma criança é de grande pertinência.

Em O vaqueiro que nunca mentia, Ilan Brenman recria, à sua maneira, a lenda do Boi Bumbá, uma das narrativas mais fundamentais da cultura popular brasileira. Essa é a lenda entranhada na célebre brincadeira do Bumba meu Boi, dançada na festa de São João em diferentes lugares do nordeste brasileiro e, em especial no Maranhão, onde foi reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Unesco.

Ao ser indaga sobre qual livro daria de presente, Patrícia respondeu prontamente: Depende para quem é o presente! Claro, não? Quando a gente escolhe um presente, o faz pensando nas preferências da pessoa presenteada, mas sempre colocamos um pouquinho do nosso olhar…

Patrícia dá suas dicas. Se fosse para a Stella (prima), eu daria o livro da menina gordinha (Laís, a fofinha). Se fosse para o Alê (primo também), o do vaqueiro que não mente (O Vaqueiro que nunca mentia, um conto popular brasileiro). Repare que ela não se lembra do título, mas das personagens. É por via das personagens que aderimos afetivamente à narrativa. Por que esses títulos? Patrícia não sabe responder, só acha que a Stella e o Alê vão gostar.

Lucina, mãe de Patrícia, tem uns palpites sobre os porquês: a Stella é bem mais vaidosa e preocupada com a aparência do que ela; o Alexandre, o mais novinho de um dos lados da família, gosta muito de aumentar umas coisinhas, para se sentir mais incluído entre os mais velhos.

Como seria começar a receber cartões com mensagens escritas pelos objetos que esquecemos por aí? Pois é a partir desse insólito mote que Drew Daywalt elabora o divertido A volta dos gizes de cera, continuação do hilário A revolta dos gizes de cera, também criado em parceria com Oliver Jeffers.

Esse título foi lançado em 2015. Marcelo o leu há tempos, mas o livro ficou lá… guardado em um lugar bem quentinho da memória: é um livro muito engraçado, tem um giz que diz que está na Floresta Amazônica, mas a foto do cartão mostra ele num lugar com neve! O livro chega a Marcelo por um trecho. Quantos livros não estão sustentados por pequenos fragmentos na nossa memória?

Em “Bom dia, bom dia”, de Brendan Wenzel, as imagens importam mais do que as (poucas) palavras. Com delicadeza, o autor convida seus pequenos leitores a mergulhar no universo vibrante e repleto de cores, formas e possibilidades da fauna do nosso planeta.

Dandara explica melhor: “Bom dia, bom dia!” tem umas imagens muito legais de animais de todo mundo e o final é mó legal! Você tem que achar os animais: o primeiro, o segundo, o terceiro, o quarto, o quinto, o sexto, o sábado, o domingo…

Os Drufs são seres muito parecidos com os humanos, porém menores. As personagens desse livro nascem de inventivas fotografias dos dedos da mão da autora, que ganham boca, olhos e as mais variadas vestimentas e cabelos. À sua maneira lúdica e criativa, Eva Furnari apresenta ao leitor muitos tipos de família, cada um com suas excentricidades e dramas.

Vejam o que diz Dandara, mexendo os dedinhos: Adoro o DRUFS! É de dedinhos! A minha família preferida é a dos Gorrinhos, porque tem o RARARÁ… Até o meu gato gosta dos Drufs!

Para quem quiser saber quem é o RARARÁ, um brinde!

Espero que tenham gostado dessas dicas tão saborosas. Elas já são um presente de Natal, não é mesmo? Boas leituras! Boas festas! Boas férias! Até 2022…

Sobre o(a) autor(a)

Artigos

Formada em Língua e Literatura pela PUC/SP, com mestrado em Filologia e Língua Portuguesa pela USP, atuou em diversos programas de formação continuada. Assessora escolas particulares de São Paulo. É coordenadora dos projetos de leitura da Editora Moderna, além de atuar como professora de cursos de formação de escritores. Atualmente, assina a coluna Literatura com Mazé Nóbrega no blog Redes Moderna.